Nem todo mundo sabe, mas os clássicos infantis que conhecemos (ou contos de fadas) como Branca de Neve, João e Maria, Chapeuzinho Vermelho e muitos outros dos irmãos Grimm e de diversos autores do século XVI pra frente eram muito mais sombrios e viscerais do que são hoje, pois a civilização era diferente e mais bárbara. E para isso as palavras deveriam chocar ainda mais. A partir do século XVIX e décadas depois com o surgimento da Disney, os contos foram amenizados e açucarados para as crianças de hoje.
O que o diretor Matteo Garrone do ótimo “Gomorra” fez foi pegar contos de fadas daquela época – em especial a coletânea chamada Pentamerone do autor e poeta italiano Giambattista Basile – e adaptar pro cinema exatamente do jeito que foram contadas. Não deu certo. Por uma série de pequenos fatores, mas principalmente pelo roteiro não entender algumas diferenças primordiais entre aquele tempo e o nosso e entre duas mídias bem diferentes (livro e cinema).
Mas antes, vamos à sinopse: dividindo-se em três histórias situadas no mesmo mundo mas em três reinos diferentes e entrelaçadas no tempo, primeiro temos uma rainha (Salma Hayek de “Professor Peso Pesado”) que deseja ter um filho a qualquer custo, o qual se mostrará muito alto no futuro; Um rei devasso (Vincent Cassel de “A Bela e a Fera”) que acaba se apaixonando por uma voz sem saber que sua dona é uma velha cheia das más intenções; e finalmente outro rei (Toby Jones de “Capitão América 2”) que se apaixona por uma pulga como seu animal de estimação (sim, isso mesmo) e depois que ela morre, joga sua frustração em cima da filha e vai jogá-la num terrível destino.
Sobre não dar certo, primeiramente o roteiro joga uma história de crianças de uma época para adultos de outra época. Não casou, porque o público-alvo pede coerência e o fato de não tê-la e nem se preocupar em ser coeso causa desinteresse e tédio, além de que o ritmo que parece muitas vezes se perder pra se achar lá na frente não ajuda nem um pouco. Se para crianças certas sutilezas passam batido, para os adultos há vários pontos em que a história parece se desconectar de seu próprio contexto. Isso se agrava quando percebemos que a adaptação das páginas pra tela grande foi feita na marra e sem respeitar um timing narrativo.
Por outro lado, a direção de arte é uma das mais belas em filmes do gênero com uma criatividade ímpar que exigiu pouco dinheiro com um resultado fabuloso. A fotografia de Peter Suschitzky (“Mapa Para as Estrelas”) é uma atração a parte (o desfecho dava para enquadrar e colocar na parede de qualquer sala), enquanto a belíssima trilha do mestre Alexandre Desplat (“A Garota Dinamarquesa”) faz pela história o que nem ela faz por si mesma.
Infelizmente os aspectos técnicos e artísticos primorosos não são suficientes para conferir a “O Conto dos Contos” a narrativa que ele merecia ter ou o filme que ele deveria ser.
Ficha Técnica
Elenco:
Salma Hayek
Vincent Cassel
Toby Jones
John C. Reilly
Shirley Henderson
Hayley Carmichael
Bebe Cave
Stacy Martin
Christian Lees
Jonah Lees
Laura Pizzirani
Franco Pistoni
Jessie Cave
Direção:
Matteo Garrone
Produção:
Matteo Garrone
Anne Labadie
Jean Labadie
Jeremy Thomas
Fotografia:
Peter Suschitzky
Trilha Sonora:
Alexandre Desplat
