Quando fez “Lincoln”, o mestre Steven Spielberg mostrou o que tem de pior: uma superprodução com tantos predicados técnicos, mas devastada por uma narrativa óbvia, evidente e ululante (tão prolixa quando os três últimos adjetivos juntos), além de um patriotismo que chega a ser chato e inconveniente, coisa que se repetiu também em “Cavalo de Guerra”.
Apesar de “Ponte de Espiões” ser sem dúvida superior a eles, essa tendência continua latente aqui: Tom Hanks (“Walt nos Bastidores de Mary Poppins”) é James Donovan, um bem sucedido advogado de seguros que é cooptado a defender um réu russo acusado de espionagem em plena Guerra Fria. Nesse momento delicado em que é visto com maus olhos pela população americana, ele acaba tendo que ir na perigosa Berlim Oriental negociar uma troca entre seu réu espião e outro agente americano que caiu em solo russo.
Mais uma vez o diretor mostra seu apuro técnico e perfeccionismo numa reconstituição de época impecável, chegando em detalhes e planos brilhantes, como aquele em que foca as lâmpadas das câmeras dos repórteres no chão na saída de um julgamento, alem de edições inteligentes e dinâmicas.
Mas o brilhantismo para na hora em que a narrativa começa. Ela (a narrativa) parece sempre dizer o que vai acontecer nos próximos trinta minutos deixando o espectador sem nenhuma perspectiva de se surpreender: quando Donovan fala que é melhor deixar o espião russo viver, pois pode um dia haver a necessidade de uma suposta troca, escancara o que vai acontecer em seguida; Quando o agente da CIA diz para Donovan não se aproximar do muro senão pode ser morto a tiros, mais uma vez fica claro que daqui a pouco, ele vai ver a cena acontecer; Quando vemos logo a primeira cena, o jeito matreiro de negociar do protagonista, entendemos de cara que ele vai usar os mesmos argumentos durante o filme inteiro; Quando ele diz que teme pela segurança de sua família, não dá cinco minutos antes dela sofrer uma ameaça. E até mesmo sem palavras, o cineasta dá deixas óbvias: por exemplo, quando Donovan está no ônibus sofrendo com olhares reprovadores de seus passageiros por defender um espião russo, imediatamente se faz uma rima rasa e risível com o terceiro ato onde as MESMAS pessoas irão olhá-lo como herói.
Só pelos exemplos, já dá pra entender que o filme se pauta por uma desconfortável previsibilidade que, mesmo com alguns ótimos momentos, bem humorado e um elenco competente, não escapa dos lugares comuns. “Ponte de Espiões” vale por uma história forte com Hanks fazendo o que pode e muito bem feito, mas se dilui num mar de clichês, patriotismo pseudo edificante e na falta de tato em contar uma história que Spielberg insiste em não se preocupar.
Ficha Técnica
Elenco:
Tom Hanks
Mark Rylance
Amy Ryan
Alan Alda
Joshua Harto
Domenick Lombardozzi
Victor Verhaeghe
John Rue
Billy Magnussen
Jillian Lebling
Noah Schnapp
Eve Hewson
Joel Brady
Direção:
Steven Spielberg
Produção:
Kristie Macosko Krieger
Marc Platt
Steven Spielberg
Fotografia:
Janusz Kaminski
Trilha Sonora:
Thomas Newman