A cena chega a ser sentimentalista: pai e filha brincando num terreno baldio. Ele (Nicolas Cage de “Vício Frenético“) promete a ela (a atriz mirim Chloe Moretz de “500 Dias com Ela“) que se fizer o que o amoroso papai pede, eles vão tomar sorvete depois. De pronto ela concorda entusiasmada e é aí que ele aponta uma pesada arma e atira à queima-roupa na própria filha. Arremessada pra trás, poucos segundos depois ela confessa que adorou a experiência.
Não é assim que começa o filme, mas dá pra se ter uma vaga idéia do quão subversivo ele é, principalmente para o gênero super-herói, o qual costuma ser obrigatoriamente mais leve para o público. Antes, conhecemos o principal fio condutor da trama, Dave (Aaron Johnson), um adolescente comum até demais que começa a se questionar sobre ser herói de forma dentro de um contexto sociológico. Inseguro, ele compra uma fantasia (uma roupa de mergulho paramentada) e sai pelas ruas. Na primeira ocorrência, ele quase é linchado. E diga-se de passagem com uma violência gráfica absurda. Já na segunda tentativa, depois de recuperado, ele se dá relativamente bem, mas pouco depois desperta a ira de um mafioso local (o habitual bandido Mark Strong de “Robin Hood“) por engano.
O roteiro é genial em unir todos esses personagens em torno da própria cultura que o ser humano tem dos super-heróis e até mesmo super vilões. Mais do que isso, faz uma reflexão da própria necessidade do ser humano de se relacionar e dos artifícios que eles usam para tal, seja com nobres propósitos ou não.
Mas deixando filosofias de lado, é uma façanha que a produção consiga combinar tão bem uma narrativa amarrada e cenas de ação coreografadas e editadas a perfeição, seja quando Big Daddy (Cage) mata todos os bandidos num armazém, na visão de uma câmera de espionagem; seja quando Hit Girl (Moretz) faz um arriscado salvamento num galpão sem absolutamente nenhuma luz. Aliás, ela é sem dúvida o destaque do filme: é claramente uma criança (tem 13 anos na vida real), mas seu personagem é intenso e ela parece ter vivido todo aquele transtorno principalmente na improvável e beirando desesperadora relação com seu pai.
Como se não bastasse o diretor Matthew Vaughn (“Stardust – O Mistério da Estrela“) consegue matar todos os clichês com tomadas inusitadas e textos afiados, como naquele em que Dave narra em off que não é porque ele está narrando a história que ele vai terminar vivo e ainda cita nomes de filmes onde o personagem que narra está morre no final; ou então na hilária frase parodiando a célebre “Com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades” do “Homem-Aranha“.
“Kick Ass” tem uma combinação de ingredientes incomum que logra êxito em levar absolutamente todos os tipos de público a uma jornada incrível que com quase duas horas de duração, ainda acaba com gosto de se querer mais. É o melhor filme de super-herói do ano. Ou dos últimos anos ao lado de “Batman – O Cavaleiro das Trevas“.
[rating:5]
Ficha Técnica
Elenco:
Aaron Johnson
Nicolas Cage
Chloe Moretz
Christopher Mintz-Plasse
Mark Strong
Lyndsy Fonseca
Garrett M. Brown
Elizabeth McGovern
Clark Duke
Direção:
Matthew Vaughn
Produção:
Adam Bohling
Tarquin Pack
Brad Pitt
David Reid
Kris Thykier
Matthew Vaughn
Fotografia:
Ben Davis
Trilha Sonora:
Marius De Vries
Ilan Eshkeri
Henry Jackman
John Murphy